O anúncio de um novo plano nacional com mais recursos para a Educação Básica merece boas-vindas. Seu sucesso, porém, depende em primeiro lugar de uma boa formação de professores, especialmente dos que atuam nas escolas públicas menos favorecidas. Crianças e jovens podem ser receptivos e cordiais ou apáticos e agressivos; podem estar animados com suas perspectivas ou desmotivados por conviver com gente que saiu da escola sem meio nem razão de vida. Por isso, quanto mais difíceis as condições de ensino, maior deve ser o preparo conceitual e técnico do professor — e não o contrário, como, numa lógica perversa, alguns defendem.
Para deixarmos de ser campeões na desigualdade, um programa de aperfeiçoamento da formação inicial e em serviço deve não só considerar isso, mas ter muita clareza sobre qual formação queremos promover. Não basta ser letrado, matemático ou historiador nem saber os fundamentos filosóficos da Educação. É preciso também conhecer a escola e conviver com professores experientes, que atuem como tutores e sejam remunerados para tal. Isso é tão óbvio quanto reconhecer que anatomia teórica e psicologia infantil são importantes, mas não suficientes para formar cirurgiões e pediatras. Eles precisam de uma vivência prática numa residência médica supervisionada. Infelizmente, nossos jovens têm de procurar muito para encontrar cursos em que, além de receberem uma boa base cultural, possam entrar em contato com a realidade das escolas de Educação Básica e, nelas, aprender a alfabetizar ao lado de uma boa alfabetizadora e a ensinar Matemática ou História com bons mestres, numa espécie de “residência pedagógica”.
Há grandes universidades públicas em que as licenciaturas são depreciadas como meros subprodutos, pois suas aulas nem sequer pesam na avaliação docente. Entre os que ensinam a ensinar, há muitos que não veem uma sala de aula com crianças desde quando eram crianças... Há também muitos cursos de Pedagogia que, ao formar, ao mesmo tempo, futuros gestores escolares e professores, em seus currículos sobrecarregam a visão sistêmica e administrativa, com prejuízo da formação para a sala de aula (como se um mesmo programa fosse capaz de formar gestores hospitalares e médicos). Por isso, é preciso evitar que uma pedagogia do discurso predomine sobre a arte de ensinar ou que a preleção abstrata tome o espaço da vivência didática. As mais recentes diretrizes oficiais de formação docente até que aumentaram a exigência de práticas formativas, mas isso só será cumprido por faculdades que tenham vínculos com a Educação Básica. E, no novo plano educacional, anuncia-se a formação docente em centros de Educação Tecnológica porque se espera que nessas instituições os cursos formativos tenham mais espaço para atividades didáticas do que em muitas universidades e faculdades.
O ideal é que a formação estivesse articulada com redes municipais e estaduais, com cooperação mútua: as universidades responderiam pelo aperfeiçoamento permanente em serviço e as escolas abririam as portas para garantir as atividades práticas da formação inicial, oferecendo seus melhores quadros como tutores. Um programa como esse, incorporado ao plano nacional, aperfeiçoaria os professores e, ao mesmo tempo, aprimoraria as escolas brasileiras. Afinal, nunca é demais lembrar que sem bons professores não há boas escolas e, sem estas, as expectativas de melhorar a Educação fatalmente acabarão frustradas.
Luis Carlos Menezes é físico e educador da Universidade de São Paulo. Endereço eletrônico: pensenisso@abril.com.br
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